domingo, 19 de maio de 2019

Chi Sau: aprender e recomeçar do zero.



Si Fu observa Chi Sau entre Si Suk Diego Guadelupe (camisa dourada) e Gil Batista.

Ouvi de meu Si Fu, Mestre Senior Julio Camacho, uma frase muito importante e ao mesmo tempo muito difícil de ser vivida: " É preciso ter um bom coração e uma péssima memória". O contexto da frase fala sobre a importância de saber zerar uma falha, uma ofensa, enfim, algo de ruim que alguém tenha dirigido contra nós. Isso está longe de ser "bonzinho". Esta frase deve ser lida à luz do pensamento estratégico.
    O Chi Sau (que pode ser traduzido como "rolar braços") acompanha o praticante de Ving Tsun por um longo tempo em sua jornada. Diversos são os sentimentos que podem ser experimentados nesta rica prática: raiva, frustração, medo, covardia, satisfação, alegria, e tantos outros. Hoje não vou falar sobre as técnicas associadas ou sobre os pontos que podemos observar durante a rolagem dos braços aderidos. Venho falar sobre algo que também é muito importante, e que esta prática nos dá oportunidade de desenvolvermos, sendo ao mesmo tempo tão importante e tão difícil de adquirir: a capacidade de recomeçar do zero.
Assim como qualquer pessoa, já experimentei (e ainda experimento) algumas frustrações na vida, mas posso dizer que não saio delas da mesma forma como saía antes, primeiro graças à relação com meu Si Fu, e também através dele, e por segundo, pela prática do Ving Tsun.
O Chi Sau mostra entre outras coisas que muitas vezes somos golpeados porque nos colocamos na situação para que isto aconteça. A leitura que o companheiro de prática faz da nossa energia, posicionamento, distância e do timing,  levam-no muitas vezes, a golpear-nos. É como se "pedíssemos" por isso, dando ao outro todas as condições. Na vida não é diferente.



Praticantes, hoje Mestres: Si Suk Diego Guadelupe (camisa dourada) e Si Hing Thiago Pereira (Líder da Família Moy Fat Lei) praticando o Lei Dei Chi Sau. 



Muitas vezes nosso comportamento nos leva a sermos "golpeados pela vida" de modo que todo  ser humano sente muito daquilo que um praticante de Ving Tsun sente na prática do Chi Sau. Porém, da mesma forma que depois de um golpe, voltamos a posição inicial, e zeramos para nova "rolada de braços", assim é a vida; depois do golpe ela continua e precisamos seguir em frente.
Sim, é muito difícil na prática, e isso me faz lembrar outra frase de meu Si Fu, quando um irmão Kung Fu meu reclamou sobre a dificuldade em lidar em certas situações, que envolviam inclusive outros irmãos nossos: " Eu sei que não é fácil zerar certas coisas. Isso é treinado..." Esta frase me marcou muito porque a exemplo de meu Si Fu que já alcançou este nível, tenho o objetivo de também chegar a ele. Afinal, quem sabe zerar não está alheio ao que ocorreu, menos ainda age desta forma por ser mais fácil, muito pelo contrário. Ter poder pessoal para escolher, sem ser dominado pela emoção, é um estágio de desenvolvimento elevado.
 Se deixar afetar para além daquilo que o fato tem o potencial de incomodar acusa certa imaturidade ao passo que, não ser afetado, por ter aumentado sua zona de conforto na adversidade, por ter sido treinado para lidar com ela, aprendendo com a circunstância e não a culpando, isso é ter Kung Fu.  
 É saber agir na vida, assim como no Chi Sau: ser golpeado, aprender com isso, zerar e começar de novo.


Si Fu recebe em sua casa com direito à prática de Chi Sau em sua varanda: Si Suk Diego Guadelupe, Si Hing Vladimir Anchieta e Si Hing Thiago Pereira (da esquerda para a direita). 

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